segunda-feira, 28 de agosto de 2017

 20 - Ação De Graças
Congregados, agora, no instituto socorrista de Fabiano, preparamo-nos para a ditosa viagem de regresso.

Efetivamente, as saudades de nossa vida harmoniosa e bela,nos planos mais altos, dominavam-nos os corações.


 O serviço nas regiões inferiores proporcionava-nos, é bem verdade, experiência e sabedoria, acentuava-nos o equilíbrio, enriquecia-nos o quadro

de aquisições eternas; entretanto, o reconhecimento de semelhantes valores não impedia a sede daquela paz que nos aguardava, a

distância, no lar tépido e suave das afinidades mais puras.

Em todos nós preponderava o júbilo decorrente da tarefa exemplarmente realizada, mas o próprio Jerônimo não disfarçava o

contentamento de regressar, na impressão de calma e bom ânimo que lhe fulgurava o semblante feliz.

Ao esforço sincero, seguia-se a tranqüilidade do dever cumprido.

Marcada a reunião derradeira na Casa Transitória, rodeavam- se os recém-libertos de vários amigos que lhes traziam alegres

notícias e boas-vindas confortadoras. Dimas e Cavalcante, renovados em espírito, ignoravam como exprimir o reconhecimento

que lhes vibrava n'alma, enquanto Adelaide e Fábio, mais evolvidos na senda de luz divina, comentavam problemas transcendentes do destino e do ser, através de observações formosas e surpreendentes, recolhidas na vasta esfera de experiências individuais.

Notas de alegria e otimismo transpareciam de todas as palestras, projetos e recordações.

A irmã Zenóbia solicitou que a esperássemos na câmara consagrada à prece, onde nos abraçaria, dando-nos as despedidas.


Reunidos em alegria franca, aguardávamos a diretora nas melhores expansões de entendimento fraternal.

Zenóbia, poucos momentos depois, dava entrada no salão, seguida de grande número de auxiliares, e, como sempre, veio até

nós, bondosa e acolhedora. Estimava, sobremaneira, a expedição e devotara-se carinhosamente aos recém-libertos. Em vista disso,

cercava-nos de atenção pessoal e direta, naquele momento de maravilhoso adeus.

Assumindo a posição de orientadora dos trabalhos, exortou- nos, de modo comovente, à fiel execução da Vontade Divina, comentando a beleza das obrigações de fraternidade que se entrela-

çam, no Universo, fortalecendo a grandeza da vida. Por fim, saudando individualmente os recém-desencarnados, recomendou a

Adelaide pronunciasse, ali, a oração de graças, que faria acompanhar do hino de reconhecimento que ela, Zenóbia, nos ofereceria, em sinal de afetuoso apreço.


Adelaide levantou-se, em meio de profundo silêncio, e orou, fervorosa, comovida:


– A ti, Senhor, nossos agradecimentos por esta hora de paz

intraduzível e de infinita luz. Agora, que cessou a nossa oportunidade de trabalho nos círculos da carne, nós te agradecemos os

benefícios recolhidos, as aquisições realizadas, os serviços levados a efeito... Mais que nunca, reconhecemos hoje a tua magnanimidade indefinível que nos utilizou o deficiente instrumento na

concretização de sublimes desígnios! Vacilantes e frágeis, como

as aves que mal ensaiam o primeiro vôo longe do ninho, encontramo-nos aqui, venturosos e confiantes, ao pé de teus desvelados

emissários que nos ampararam até ao fim!... Como agradecer-te o tesouro inapreciável de bênçãos celestes? Teu carinho santificante seguiu-nos, passo a passo, em todos os minutos de permanência no vale das sombras e, não satisfeito, teu inesgotável amor acom-panha-nos, ainda, nesta retirada da velha Babilônia de nossas paixões amargurosas e milenárias.

Quase sufocada de emoção, a missionária fez reduzido silêncio para conter as lágrimas, e continuou:

– Nada fizemos por merecer-te a assistência bendita. Nenhum mérito possuímos, além de boa vontade construtiva. Claudicamos, vezes sem número, dando pasto aos caprichos envenenados que nos obscureciam a consciência; falimos freqüentemente, cedendo

a sugestões menos dignas. Entretanto, Jesus Amado, converteste-nos o trabalho humilde em manancial de ventura que nos alimenta

o coração, soerguido para as esferas mais altas. Desculpa-nos, Mestre, a imperfeição de aprendizes, traço predominante de nossa

personalidade libertada. Não possuímos nada de belo para oferecer-te, ó Benfeitor Divino! senão o coração sincero e humilde,

vazio agora das abençoadas preocupações que o nutriam na Crosta da Terra... Recebe-o, Mestre, como demonstração da confiança de

teus discípulos pequeninos, e enche-o, de novo, com as tuas sacrossantas determinações! Reconhecidos à tua inesgotável misericórdia, agradecemos a ternura de tuas bênçãos, mas, se nos deste

proteção e consolo, não nos retires o trabalho e o ensejo de servir.

Conduze-nos aos teus “outros apriscos” e renova-nos, por compaixão, a bênção de sermos úteis em tua causa. Cheios de alegria,

abençoamos o valioso suor que nos proporcionaste na esfera da

carne purificadora, onde, ao influxo de tua benignidade, retificamos velhos erros do coração... Bendizemos o caminho áspero que

nos ensinou a descobrir tuas dádivas ocultas, beijamos a cruz do sofrimento, do testemunho e da morte, de cujos braços nos foi

possível contemplar a grandeza e a extensão de tuas bênçãos eternas!..

Adelaide fez nova pausa, enxugando o pranto de emoção, enquanto a seguíamos sensibilizados, e prosseguiu: – Agora, Senhor, assinalando nossos agradecimentos aos teus

emissários que nos estenderam mãos amigas, nas últimas dificuldades da moléstia depuradora, deixa que te roguemos amoroso

auxílio para todos aqueles, menos felizes que nós, que ainda gemem e padecem nas sendas estreitas da incompreensão. Inspira os

teus discípulos iluminados para que te representem o espírito sublime, ao lado dos ignorantes, dos criminosos, dos desviados, dos

perversos. Toca o sentimento de caridade fraternal dos teus continuadores fiéis para que continuem revelando o benefício e a luz

de tua lei. E, ao encerrar este ato de sincera gratidão, enviamos nosso pensamento de alegria e louvor a todos os companheiros de

luta, nos mais diversos departamentos da vida planetária, convidando-os, em espírito, a glorificarem teu nome, teus desígnios e

tuas obras, para sempre. Assim seja!

Finda a prece comovedora, a irmã Zenóbia veio abraçar Adelaide, extremamente sensibilizada, e, logo após, reassumindo o

lugar, recomendou aos auxiliares ajudassem-na no formoso cântico de agradecimento ao círculo terreno que os irmãos libertos

acabavam de deixar. Imergindo-nos num dilúvio de vibrações cariciosas que nos arrancavam lágrimas de suave emoção, iniciou, ela própria, o hino de indefinível beleza:


Ó Terra – mãe devotada,
A ti, nosso eterno preito
De gratidão, de respeito
Na vida espiritual!
Que o Pai de graça infinita
Te santifique a grandeza
E abençoe a natureza
Do teu seio maternal!
Quando errávamos aflitos,
No abismo de sombra densa, Reformaste-nos a crença
No dia renovador.
Envolveste-nos, bondosa,
Nos teus fluidos de agasalho,
Reservaste-nos trabalho
Na divina lei do amor.
Suportaste-nos sem queixa
O menosprezo impensado,
No sublime apostolado
De terno e infinito bem.
Em resposta aos nossos crimes,
Abriste nosso futuro,
Desde as trevas do chão duro
Aos templos de luz do Além.
Em teus campos de trabalho,
No transcurso de mil vidas,
Saramos negras feridas,
Tivemos lições de escol.
Nas tuas correntes santas
De amor e renascimento,
Nosso escuro pensamento
Vestiu-se de claro sol.
Agradecemos-te a bênção
Da vida que nos emprestas;
Teus rios, tuas florestas,
Teus horizontes de anil,
Tuas árvores augustas,
Tuas cidades frementes,
Tuas flores inocentes
Do campo primaveril!... Agradecemos-te as dores
Que, generosa, nos deste,
Para a jornada celeste
Na montanha de ascensão.
Pelas lágrimas pungentes,
Pelos pungentes espinhos,
Pelas pedras dos caminhos:
Nosso amor e gratidão!
Em troca dos sofrimentos,
Das ânsias, dos pesadelos,
Recebemos-te os desvelos
De mãe de crentes e incréus.
Sê bendita para sempre
Com tuas chagas e cruzes!
As aflições que produzes!
São alegrias nos céus.
Ó Terra – mãe devotada,
A ti, nosso eterno preito
De gratidão, de respeito,
Na vida espiritual!
Que o Pai de graça infinita
Te santifique a grandeza
E abençoe a natureza
Do teu seio maternal!

Quando soou a derradeira nota do hino repassado de misterioso encanto, olhos nevoados de lágrimas, trocamos com Zenóbia

carinhoso abraço de adeus. Nós outros, os da expedição socorrista, tomávamos os recém-
libertos pelas mãos, imprimindo-lhes energia para a subida prodigiosa, cercados de amigos que nos seguiam, alegres e venturosos,

a caminho das zonas mais elevadas.


Estranho e indefinível júbilo nos vibrava no peito, empolgado de vigorosa esperança, e, depois de atravessar os círculos de baixo padrão vibratório, em que se localizava o instituto de Fabiano, ganhamos região brilhante e formosa, coberta pelo céu faiscante

de estrelas!... Saudando-nos de muito longe, o astro da noite apareceu em maravilhoso plenilúnio, emitindo raios de doce e evanescente claridade que, depois de nos iluminar o caminho numa

pulcritude de sonho, desciam, céleres, para a Crosta da Terra, espalhando entre os homens o convite silencioso à meditação na

gloriosa obra do Deus.

--- Fim ---

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